Estar cada vez melhor

Rubens Vilela / Psicanalista


A ideia de sexualidade, presente na obra freudiana desde a década de 1890, consolidou-se com o estabelecimento da noção de pulsão, nos “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, publicados em 1905. Para ele fica cada vez mais claro que o que nos move, a todos, o motor da nossa sexualidade é essa força interior de ‘pressão constante’, cuja fonte é alguma zona erógena de nosso corpo e que tem por finalidade obter satisfação através de qualquer objeto que lhe sirva. Somos, todos, arrastados, ao longo de nossas vidas, por nossa busca incessante por satisfação…

Quando uma mãe cuida do seu bebê, ela (quase) sempre cuida com muito carinho e amor. A fome é saciada com leite e amor, a sede é saciada com suquinho e amor, o frio com uma mantinha e mais amor… Assim, o bebê logo liga a satisfação de suas necessidades básicas com amor e suas demandas à mãe se transformam, aos poucos, em demandas de amor: se está com fome, a fome é mais fome de amor; se está com sede, é mais uma sede de amor. Suas necessidades começam a ser, para ele, representadas por FALTA DE AMOR e, com suas idas e vindas, sua mãe se transforma naquele objeto para sempre perdido de uma satisfação que, sempre procurada, nunca se repetirá.

Daí vem essa marca indelével de insatisfação de que todos somos portadores. Insatisfação por faltas, em sua maioria, inconscientes, por estarem suspensas no hiato de nossas palavras. Minha geladeira pode estar repleta de coisas para as quais, com fome, olho com a sensação: “não estou com vontade de nada disso.” E, aí, saio para comer outra coisa na padaria, porque nada daquilo satisfaria essa minha falta que não sei exatamente de quê… Prisioneiros de faltas tão fugidias, saímos construindo expectativas e correndo atrás de objetos na tentativa de reencontrar nosso objeto há muito perdido, nas filigranas de nosso olhar, de nosso escutar, de nosso cheirar…

Quando nos perdemos neste ciclo, isto se chama COMPULSÃO.

 

Se sou um eterno insatisfeito, o que fazer?

Não é à toa que, para Lacan, uma das tarefas de uma análise é ajudar o paciente a encontrar o que ele chamou de ´objetos a´: esses pontos de falta que podem ser identificados nela e virem a representar uma reorientação de sua vida, dando um sentido diferente ao esforço de permanecer vivo – viver para perseguir objetos que realmente tragam uma satisfação diferente, menos fugidia, menos lábil, mais durável. Transformar pequenos e raros momentos de felicidade em algo mais duradouro: estar satisfeito consigo mesmo e com sua vida. Por isso vemos tantas pessoas fazendo trabalhos voluntários, por exemplo. Com ou sem ir ao divã, perceberam que suas faltas podem ser melhor completadas por eles. E, por isso também, aos pacientes deprimidos indica-se uma análise: eles são o paradigma da perda de contato com suas faltas. Também por isso, no Amor-Exigente, grupo do qual sou voluntário, iniciamos todas as reuniões lembrando a todos de que nosso objetivo de vida é estar cada vez melhor e, em todas as reuniões, estabelecemos metas individuais para isso, usando as partilhas como uma análise coletiva: o que ainda me falta?…